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quarta-feira, 3 de março de 2010

O Infante D. Henrique

É um dos vultos mais brilhantes da Idade Média. É o homem que simboliza a glória dos descobrimentos. O Infante D. Henrique é um príncipe medieval obcecado pela ideia de cruzada que arrasta a Europa e o mundo para a modernidade da comunicação entre os povos. Foi um excêntrico para a sua época. “Tinha uma visão e conseguiu concretizá-la, à custa de muito esforço e trabalho. É esse o mérito de D. Henrique”, aponta Ferreira do Amaral, ex-ministro das Obras Públicas e seu profundo admirador. “Um visionário”, acrescenta o empresário Filipe de Botton, outro dos seus admiradores. 

Nascido no Porto em 3 de Março de 1394, o Infante foi o quinto filho de D. João I e de D. Filipa de Lencastre. Em 1414 convenceu o pai a organizar a expedição a Ceuta, que foi conquistada em 1415, marcando o início da expansão portuguesa. Se não existisse “um Infante D. Henrique, planeador, estratega, com a noção do que pretendia e a insistir sistematicamente, esta expansão teria ficado a meio, como ficou noutros países”, assegura Ferreira do Amaral. 

O sucesso deste feito valeu ao Infante, nesse ano, os títulos de duque de Viseu, desconhecido então em Portugal, e de senhor da Covilhã, o que aumentou largamente o seu património. Aos rendimentos da sua casa senhorial juntou os da Ordem de Cristo, da qual foi nomeado regedor em 1420. Foi este desafogo económico que o levou a organizar, primeiro, uma armada de corso e, mais tarde, a exploração do Atlântico. “É o único português que figura em todas as histórias da Europa”, afiança o jornalista Carlos Magno. O Infante D. Henrique queria enriquecer mas, acima de tudo, conhecer novos mundos. Tinha aquela lucidez forte e taxativa dos visionários com um objectivo traçado. “Era muito pragmático. Procurou sempre engrandecer a sua casa, ao mesmo tempo que perseguia um sonho: o da cruzada”, concretiza João Oliveira e Costa, director do Centro de História de Além-Mar, da Universidade Nova de Lisboa. “Os descobrimentos nasceram dessa combinação.” 

De facto, navios ao seu serviço chegaram pela primeira vez à Madeira em 1419 e aos Açores em 1427, ilhas que foram povoadas por ordem do Infante. Mas este homem de espírito voluntarioso e extraordinária obstinação queria ir mais além. O reconhecimento da costa ocidental africana era um dos seus objectivos. A passagem do cabo Bojador por Gil Eanes em 1434 foi um grande êxito e terminou com os medos ancestrais relacionados com aquelas paragens longínquas. Já tinham sido feitas diversas tentativas para dobrar o cabo, mas os navegantes acabavam sempre por recuar. “Se a sociedade global em que vivemos tem uma origem remota e indiscutível, é a passagem do cabo Bojador por Gil Eanes”, garante João Oliveira e Costa. O Infante D. Henrique “é o primeiro marco da globalização”, confirma Fernando Seara, presidente da Câmara de Sintra. 

O Infante não se dedicou à navegação por simples aventura, “dedicou-se de forma científica, mas também religiosa, porque queria propagar a fé cristã e combater o islamismo”, diz o cantor João Braga. “Discutiu-se muito sobre o seu objectivo, mas acho que, na verdade, o objectivo final era fazer um ‘bypass’ ao cordão islâmico do Norte de África”, clarifica Ferreira do Amaral. 

A sua biografia não é feita só de êxitos. De facto, foi um dos principais proponentes da conquista de Tânger, que se tentou em 1437 e que terminou de forma trágica devido à prisão e posterior morte no cativeiro do seu irmão, o infante D. Fernando. As viagens de exploração foram retomadas em 1441, com Dinis Dias a chegar ao rio Senegal e a dobrar o cabo Verde três anos depois. A Guiné é ainda visitada no seu tempo. Até ao ano da morte do Infante D. Henrique, em 1460, a costa africana foi reconhecida até à Serra Leoa. “Um homem inteligente e com coragem”, diz o presidente da Câmara Municipal do Porto, Rui Rio. O avanço nas explorações foi acompanhado pela criação de feitorias, através das quais se trocavam produtos europeus por ouro, escravos, malagueta, algodão e marfim. 

Apesar de só ter sulcado as ondas do oceano para as suas expedições de conquista em Marrocos, ficou conhecido como “o Navegador”. Um cognome bastante merecido, pois é a ele que se deve o primeiro impulso e grande incitamento das navegações posteriores. 

Segundo a lenda, o Infante D. Henrique fundou, como governador do Algarve, a mítica “Escola de Sagres”, com relevante importância, mas que nunca existiu no sentido físico, como explica João Oliveira e Costa: “É no Sudoeste algarvio que nasce a caravela dos descobrimentos e alguns dos instrumentos de orientação em alto-mar, que depois foram usados com sucesso. Nessa perspectiva, podemos dizer que houve uma ‘Escola de Sagres’. Não no sentido de um edifício.” 

Apaixonado pelas ciências cosmográficas, o Infante foi o maior matemático do seu tempo, aplicou o astrolábio à navegação e inventou as cartas planas. Reuniu à sua volta os melhores cérebros internacionais no campo da ciência. “Trouxe o que de melhor havia na Europa em termos de navegadores, astrónomos, gente que conhecia o mar”, refere Filipe de Botton. “Foi buscá-los e deu-lhes todas as facilidades para poderem trabalhar”, explicita Teresa Lago, professora catedrática de Astrofísica da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. 

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