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domingo, 5 de fevereiro de 2012

A 5 de fevereiro do ano 146 terminou a terceira guerra púnica

Antecedentes da Terceira Guerra Púnica
O confronto final entre Roma e Cartago durou apenas quatro anos e terminou com a destruição total de Cartago. A guerra foi travada inteiramente na África, com os invasores romanos procurando conquistar a capital inimiga, e o desfecho nunca esteve verdadeiramente em dúvida, a menos que os Romanos decidissem abandonar a expedição. Não é fácil atribuir responsabilidades pela eclosão dos dois conflitos anteriores mas não restam dúvidas de que a Terceira Guerra Púnica foi deliberadamente provocada pelos Romanos, que tinham decidido, em consciência, aniquilar o seu velho inimigo. Os negociadores romanos exploraram descaradamente a predisposição cartaginesa para fazer concessões com o propósito de evitar a guerra com Roma, aumentando constantemente as suas exigências para impor um conflito a um inimigo debilitado. Foi uma atitude muitíssimo pior do que qualquer um dos exemplos registados da proverbial "falsidade púnica". Pelos padrões da estratégia moderna, a guerra foi desnecessária, dado que Cartago não parece ter constituído uma verdadeira ameaça para Roma. Para compreendermos porque é que os Romanos embarcaram numa politica tão intencionalmente implacável, temos que olhar de novo para a atitude romana face a guerra e para as condições peculiares de meados do século II.

A partir de 201, os Cartagineses mostraram-se consistentemente aliados leais de Roma. Forneceram cereais aos exércitos romanos e, em 191, enviaram a sua minúscula marinha para integrar a esquadra que operava contra Antioco III. Com a ajuda da reforma das finanças do Estado, levada a cabo por Hannibal, a indenização anual foi paga pontualmente até ao fim, em 151. Na série de disputas fronteiriças com a Numídia de Masinissa, Cartago submeteu-se ao arbítrio romano apesar de este, de forma declarada ou tácita, ser sempre favorável ao rei. Com ou sem verdade na acusação, foram nobres cartagineses que relataram as alegadas conversações de Hannibal com Antioco e provocaram a sua fuga, em 195. Também foram eles que prenderam e julgaram o seu agente, Ariston de Tiro, que em 193 fora enviado a Cartago para persuadir a cidade a apoiar os Selêucidas contra Roma, embora Ariston tenha conseguido escapar antes da conclusão do julgamento. Foi enviada uma delegação a Roma para dar conta do incidente e garantir ao Senado a continuada lealdade de Cartago. As fontes dizem-nos que neste meio século a politica cartaginesa foi dominada por três facções: um grupo simpatizante de Roma, liderado por Hanão, o Grande, outro pró-Masinissa, sob a liderança de Hannibal, o Estominho, e o terceiro derivando o seu apoio dos cidadãos mais pobres e chefiado por Hannibal, o Samnita, e Cartalao. O cognome de Hannibal derivaria talvez de um pai ou de um avô que servira com Hannibal em Itália, e as fontes referem também neste período um certo Magão, o Brútio, cujo nome sugere uma associação semelhante, mas não é totalmente claro que o partido democrático estivesse tão estreitamente associado aos Barcas como alguns estudiosos tem opinado. Nenhum destes grupos parece ter sido abertamente hostil a Roma. Não se sabe ao certo se a renovada prosperidade da cidade terá dado origem a algum rearmamento; as fontes literárias dizem que não mas as escavaçöes realizadas no porto indiciam o contrário. O que sabemos é que em meados do século os Cartagineses não estavam em condições de lançarem uma ofensiva de peso contra Roma, mesmo que o pretendessem fazer. No entanto, não ha dúvida de que os Romanos foram ficando cada vez mais receosos do seu aliado no período em causa.

O fim do pagamento da divida de guerra de cinquenta anos, em 151, eliminou o lembrete anual da derrota de Cartago e o estatuto subordinado da cidade. Os tratados que estipulavam um período fixo de paz entre dois Estados eram uma característica comum dos acordos gregos que punham fim aos conflitos, mas eram muito raros para os Romanos, que esperavam desfechos mais permanentes para as suas guerras. Em 265, Cartago convertera-se de aliado de longa data e distante em inimigo, o que originou uma mudança permanente na percepção romana de Cartago. Roma nunca se contentou com alianças que implicassem qualquer nível de igualdade com um antigo inimigo. A guerra foi rapidamente renovada com a Macedônia, em 200, e de novo quando Perseu aparentou estar a tornar-se forte e independente. Um aliado leal devia submeter-se a interferência de Roma, especialmente nos assuntos extemos, sempre que isso fosse do interesse de Roma. Entre 241 e 218, os Romanos apoderaram-se da Sardenha e intervieram na Hispânia, impondo concessões aos lideres púnicos sem se restringirem minimamente, e esta atitude continuou depois de 201. Em 151, Cartago deixou de pagar uma prestação anual a Roma. A cidade era próspera e o seu poder no Norte de África ainda era considerável, não obstante as terras perdidas para a Numídia. As tradições da prática bélica púnica não esperavam que um Estado vencido, em especial um Estado que não tivesse sido conquistado nem absorvido, permanecesse eternamente sujeito ao vencedor. Só os Romanos pensavam assim. Os Cartagineses já não eram aliados inequivocamente subordinados de Roma. O fato de um antigo inimigo, um inimigo que levara Roma a beira da derrota total, fosse de novo forte e independente constituía uma ameaça nas costas dos Romanos. Era esta a raiz do crescente receio que Roma tinha de Cartago.

Este sentimento era personificado por Catão. Em meados do século, o "homem novo" que combatera em Tarento, no Metauro e na África era um dos mais influentes e respeitados membros do Senado, e um dos poucos da sua geração que ainda participavam ativamente nos assuntos do Estado. Provavelmente em 153, Catão integrou uma das embaixadas enviadas para arbitrar uma disputa entre Masinissa e Cartago. Catão estava com setenta e muitos mas ainda era um orador enérgico e convincente. A delegação romana ficou profundamente impressionada com as crescentes riqueza e população da sua antiga rival. Regressado e Roma, Catão deu em concluir todos os seus discursos no Senado com a mesma frase:

"Cartago deve ser destruída". Diz-se que numa ocasião deixou cair alguns figos da dobra da toga. Os figos, informou ele aos seus ouvintes, espantados com o tamanho dos frutos, tinham sido colhidos num país a apenas três dias de viagem por mar, Catão exagerou a rapidez com que a armada púnica poderia cair sobre Roma, embora fosse efetivamente possível chegar ao Sul da Itália em poucos dias, e alguns estudiosos especularam com alguma irrelevância se Catão não teria comprado os figos em Roma ou mandado colhê-los na sua propriedade. Tratou-se de um gesto simbólico e poderoso que as fontes consideram digno de ser repetido e que ainda é recordado. Outro eminente senador, Cipião Nasica, mediu-se com Catão terminando os seus discursos com a opinião de que Cartago deveria ser preservada. Dizem as fontes que ele acreditava que a presença de um rival poderoso manteria intacta a virtude dos Romanos, um argumento que se tornou um continuo lamento no século seguinte, quando Roma mergulhou numa série de guerras civis. Na altura, poucos Romanos parecem ter concordado com ele. Plutarco refere que foi principalmente a influência de Catão que convenceu Roma a destruir Cartago, e em alguns relatos modernos figura com igual destaque a persistente malevolência do velho. Tal como em muitos outros aspectos da sua carreira, Catão terá aparentemente expressado o sentimento da maioria da população.

Durante a década de 150, houve um sentimento crescente de insegurança em Roma. As guerras das primeiras décadas do século tinham sido ganhas, com grande facilidade, por exércitos romanos compostos de oficiais e soldados extremamente experientes. A geração da Guerra Hannibalica foi-se tornando demasiado velha para cumprir o serviço militar e os seus conhecimentos e competências perderam-se. Dada a impermanência das legiões de Roma, a desmobilização dos exércitos obrigava a recomeçar o processo de instrução de novas tropas. Os soldados experientes foram substituídos por homens mais jovens e menos conscientes de que os êxitos militares de Roma se baseavam numa instrução rigorosa, numa cuidada preparação logística e numa liderança competente, convencendo-se de que o êxito lhes cabia por direito simplesmente por serem Romanos. No segundo quartel do século, houve menos gente em armas e as campanhas foram relativamente poucas. Em 155, os guerreiros lusitanos lançaram uma série de grandes incursões na província romana da Hispânia Ulterior, ataques cuja escala foi aumentando a cada sucesso. Em 154, um pretor foi morto e o seu exército duramente derrotado. Em 153, os Celtiberos infligiram várias derrotas a um exército consular comandado por Quinto Fúlvio Nobilior. Os relatos de combates duros e perigosos na Hispânia provocaram uma mini-crise em Roma, ao serem muito poucos os homens que se ofereceram para servir no exército que estava a ser formado para combater os Celtiberos, sob o comando de Lúcio Licinio Luculo. Só o exemplo de Públio Cornélio Cipião Emiliano, filho adotivo do Africano, que se ofereceu publicamente para servir como tribuno, garantiu voluntários em número suficiente. Na verdade, a guerra foi concluída antes da chegada de Luculo mas este, ávido de glória e riquezas, lançou o exército contra uma tribo amistosa, que se rendeu e foi traiçoeiramente massacrada. No ano seguinte, ocorreu uma atrocidade semelhante, quando o pretor da Hispânia Ulterior, Públio Sulpicio Galba, que já fora derrotado uma vez pelos Lusitanos, ofereceu a paz as tribos. Prometendo instalá-los em boas terras aráveis, Galba dividiu os Lusitanos em três grupos, desarmou-os e depois ordenou aos seus legionários que chacinassem os guerreiros indefesos. Um dos poucos que escapou ao massacre foi um homem chamado Viriato, que viria a revelar-se um líder carismático e um irredutível adversário de Roma. Durante mais de uma década, os Romanos foram confrontados com uma dura contenda contra os Lusitanos e os Celtiberos. Em 140, um dos seguidores de Viriato foi subornado e assassinou-o, mas foram necessários mais sete anos e recursos enormes até que o bastião celtibero de Numância fosse conquistado. Regressado a Roma, Galba foi julgado por quebra de fides, a prezada fé de Roma, sendo Catão um dos seus acusadores. Mas Galba foi inesperadamente absolvido depois de se apresentar no tribunal com os filhos, que imploraram em lágrimas clemência para o pai. Galba tornar-se-ia um dos mais famosos oradores de Roma.

As derrotas sofridas na Hispânia trouxeram à luz a inexperiência de quase todos os exércitos romanos. A substituição anual dos governadores de província e a raridade das promagistraturas encorajavam os generais a procurarem a glória antes de serem substituídos, e negavam-lhes o tempo necessário para converterem os seus soldados num exército eficaz. Esta realidade tivera muito menos peso no principio do século, quando a qualidade dos recursos humanos de Roma fora mais elevada. Mas mesmo nessa altura, a pressão para obter êxito num único ano de mandato levara Flamínio a iniciar conversações de paz com Filipe V, em 198, para logo a seguir romper as negociações e procurar uma vitória militar quando o seu comando foi prolongado por mais um ano. As sucessivas derrotas faziam cair o moral e tornavam ainda mais prováveis novas derrotas. O fracasso na proteção das comunidades hispânicas aliadas era conducente a sua defecção, aumentando o número de inimigos a combater. A dada altura, uma grande parte da Hispânia Ulterior submeteu-se a Viriato. As perdas sofridas na Hispânia ocorreram demasiado longe para constituírem uma ameaça direta ao Lácio, mas foram um grande golpe para o prestígio romano. As dificuldades para recrutar oficiais e soldados para a Hispânia, em 151, foram particularmente chocantes, pois nem a crise da invasão de Hannibal causara nos cidadãos romanos semelhante relutância face ao cumprimento do serviço militar.

Apiano diz que o Senado decidiu em segredo procurar um pretexto para uma guerra contra Cartago pouco depois de Catão regressar da África. Talvez sim, talvez não, mas as atitudes do Senado não deixam dúvidas de que era essa a sua intenção em 150-149, e é provável que o pagamento da última prestação da indenização por Cartago, em 151, tenha contribuído para essa decisão. Apenas faltava aos Romanos um pretexto para a guerra, e os seus aliados númidas não tardariam a fornecê-lo.

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