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sábado, 20 de junho de 2015

A 20 de Junho de 1974 - Uma Assembleia Magna de estudantes da Associação Académica de Coimbra decide a extinção da secção de futebol, numa altura em que a equipa está numa digressão em Espanha. Os estudantes alegam que esta secção funciona à revelia dos princípios amadores das restantes.



É uma das histórias esquecidas do futebol português: há 40 anos, a Académica “virou” Académico, resultado da convulsão política do pós-revolução. O fim esteve próximo, mas a mística de Coimbra sobreviveu.
A 8 de setembro de 1974, estreou-se na 1.ª divisão o recém-formado Clube Académico de Coimbra, consequência de um “verão quente” que a cidade dos estudantes tardou a esquecer. A Académica tinha sido extinta dois meses antes, no nascer do verão, e só a determinação dos adeptos permitiu ao emblema estudantil sobreviver.
Na convulsão política e ideológica do pós-25 de abril, uma assembleia magna de estudantes, realizada a 20 de junho de 1974, decidiu a extinção da secção de futebol da Associação Académica de Coimbra – alegando que ela não respeitava os princípios amadores das restantes secções culturais e desportivas da associação estudantil.
Os próprios estudantes que então ainda compunham a totalidade do plantel não se puderam pronunciar sobre a decisão (estavam em Espanha, numa digressão de final de época). E a tensão pós-revolucionária tinha tomado conta da academia coimbrã – e de todo o país – levou a que nem se tivesse tido em conta como a Briosa sempre fora uma bandeira na luta pela liberdade [como na mítica final da Taça de Portugal de 1969, aqui recordada].
À extinção, adeptos, jogadores e dirigentes responderam com uma mudança de sexo: a recriação do Clube Académico de Coimbra (que já existira entre 1861 e 1886, antes da fundação da Associação Académica de Coimbra, que esteve na génese da equipa de futebol). Mas o verão passou-se numa sucessão de avanços e recuos quanto à vontade da Federação Portuguesa de Futebol (então presidida por Jorge Fagundes) admitir o CAC como legitimo sucessor da AAC.
Sucederam-se tensas reuniões, duras trocas de argumentos jurídicos e inflamadas manifestações dos adeptos – com escaramuças pelo meio (incluindo cortes de estrada e a invasão do Emissor Regional de Coimbra).
A 17 de agosto, chegou a decisão final do Conselho Superior de Justiça da FPF de aceitar o Académico. Mas, então, já pouco restava da antiga secção de futebol da Associação Académica de Coimbra, que fora à histórica final da Taça de Portugal de 1969, e aos quartos-de-final da Taça das Taças de 1970, era meia-dúzia de glórias (Belo, Gervásio, Manuel António, e os irmãos Mário e Vítor Campos).
Ainda sem certezas quanto ao futuro, a equipa partiu para estágio na Figueira da Foz, de bolsos vazios. Os jogadores pagaram os próprios equipamentos e o alojamento deveu-se à boa-vontade alheia – a Naval emprestou o salão de festas para a comitiva pernoitar… e um quartel vizinho cedeu camas e armários. E aí começou a redenção: “Estou a encontrar nesta rapaziada a mesmíssima mística da velha Académica”, dizia, então, ao Record, o treinador Francisco Andrade (outro sobrevivente da final de 1969).
Perante tanta contrariedade, o campeonato de 1974/75 começou mal, com uma derrota na estreia, 0-1, em casa, com o Oriental, a 8 de setembro de 1974. A primeira vitória só chegou à 3.ª jornada (2-2-1 ao Belenenses) e a segunda à 10.ª (3-1 à União de Tomar). Mas, contra todas as expectativas, os “estudantes” salvaram-se, in extremis da despromoção (na liguilha, após acabar em 14.º lugar).
Durante uma década, o Académico lá continuou a honrar o legado da Briosa (embora em 1978/79, acabasse despromovido, iniciando um sobe e desce que só estancaria já no novo milénio…). E só a 27 de julho de 1984 é que tudo voltou ao ponto inicial, com os “rapazes de preto” a regressarem a casa – e o Académico a voltar a ser Académica.
Então, AAC (presidida por Ricardo Roque) e CAC (liderado por Jorge Anjinho) assinaram um protocolo para a reintegração da equipa de futebol na academia, sob o estatuto de “Organismo Autónomo de Futebol”. E os estudantes exultaram. “A Briosa voltou! Tranquilizam-se, por isso, as consciências, agitam-se os corações, estremece de entusiasmo a cidade, esvoaçam as capas, secam as gargantas com redobrados gritos de encorajamento para a vitória, que nunca será apenas a dos pontos mas fundamentalmente a da formação e da valorização humana, social, ética e cultural”, dizia o comunicado distribuído aos adeptos, no jogo do “regresso” (uma receção ao Sporting, na estreia da 1.ª Liga).
Nessa altura, já outra equipa – completamente amadora –
renascera na Associação Académica, inscrevendo-se nos campeonatos distritais da Associação de Futebol de Coimbra (nos quais participa, ininterruptamente, desde 1981/82). Assim, de uma mudança de sexo se fez, ironicamente, a multiplicação das Académicas.

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