Irei falar de tudo e do nada. Histórias e estórias. Coisas pensantes e desconcertantes. Fundado a 30 de Novembro de 2009 numa 2ª Feira
Previsão do Tempo
sexta-feira, 14 de setembro de 2012
Não Quero Deixar aos Meus Filhos um País de Novos-ricos que Dão Trabalho a Novos Escravos
Não Quero Deixar aos Meus Filhos um País de Novos-ricos que Dão Trabalho a Novos Escravos
Herdei um país feito de suor, de alma, de luta, de sangue, um país que me foi deixado pelo meu pai. Pelos pais de nós todos.
Sou, hoje, pai. Não posso deixar um país pior aos meus filhos. Não posso nem quero, pelo amor que sinto por eles, pelo futuro que merecem ter, também por respeito à geração anterior.
Não quero deixar aos meus filhos um país de novos-ricos que dão trabalho a novos escravos.
Escravos calados, escravos medrosos, escravos que temem, que falam baixo, que olham para o chão. Um país do respeito medo, do calado medo, do medo identidade. Do medo. Um país da caridade, e não da resposta solidária. Um país em que as pessoas estendem a mão, e não onde as pessoas agarram o que é seu por direito, um direito conquistado como seres humanos que todos os dias se levantam para uma vida de luta e de trabalho.
O nosso País não pode mais ser visto lá fora com o desdém que se olha com os que se satisfazem e docilizam com o elogio fácil, o elogio que nos faz ficar em casa pois é o que os bem comportados fazem. Não foi por isso que fomos conhecidos antes, não é por isso que seremos conhecidos agora!
Temos um governo que nos está a desafiar para sair à rua. Um desafio para mostrarmos a massa de que somos feitos. Este governo desafia-nos, olhos nos olhos. Desafia-nos nas palavras e nos actos! Não podemos mais olhar para o lado. Está na hora de, também nós, os olharmos nos olhos. Olhar nos olhos um governo que se esconde atrás da troika. Um governo que se esconde atrás da culpa de outros, a liturgia gasta da pesada herança, nunca a culpa é deles. Um governo que falha, erra, mente, mas que nos quer convencer que sempre disse a verdade e nada mais do que a verdade.
Um Primeiro-ministro que às 7:20 da tarde “sofre” enquanto fala ao país, mas que às 8 já canta, não me merece respeito.
Abriram a porta do nosso país a uma quadrilha de agiotas que nos veio saquear e pilhar, não vieram ajudar.
O mais perigoso ladrão é o que entra em nossa casa pela porta de frente, convidado, como se fosse nosso amigo. Um amigo não cobra 34,4 mil milhões por um empréstimo de 78 mil milhões!! A agiotagem travestida de solidariedade. E é suposto agradecermos!
Pelo menos permitam-nos que chamemos os bois pelos nomes! E é isso que faremos no próximo dia 15 de Setembro. Recuperar a nossa dignidade, o nosso orgulho, as nossas vidas que estão sob sequestro, por parte desta gente sinistra que entrou em nossa casa, convidada por gente ainda mais sinistra.
Mudança? Talvez começar por eleger Portugueses que governem a pensar no bem estar de nós todos, e não governem no intereresse da oligarquia arrogante, parasita, mais ou menos oculta, que nos governa desde sempre. Seria, finalmente, um bom começo. Esse será o amanhã pelo qual todos teremos que lutar!
Não é hora de ficar em casa. Espero ter muita gente na rua no próximo dia 15. Mas mesmo que sejamos poucos, vamos insistir, insistir, insistir até ao dia em que seremos muitos, o dia em que eles não vão conseguir deixar de nos ver!
Olhei para o lado, e vi gente com alma, gente ao lado da qual me orgulho de caminhar. Junta-te a nós!
RICARDO MORTE
Sou, hoje, pai. Não posso deixar um país pior aos meus filhos. Não posso nem quero, pelo amor que sinto por eles, pelo futuro que merecem ter, também por respeito à geração anterior.
Não quero deixar aos meus filhos um país de novos-ricos que dão trabalho a novos escravos.
Escravos calados, escravos medrosos, escravos que temem, que falam baixo, que olham para o chão. Um país do respeito medo, do calado medo, do medo identidade. Do medo. Um país da caridade, e não da resposta solidária. Um país em que as pessoas estendem a mão, e não onde as pessoas agarram o que é seu por direito, um direito conquistado como seres humanos que todos os dias se levantam para uma vida de luta e de trabalho.
O nosso País não pode mais ser visto lá fora com o desdém que se olha com os que se satisfazem e docilizam com o elogio fácil, o elogio que nos faz ficar em casa pois é o que os bem comportados fazem. Não foi por isso que fomos conhecidos antes, não é por isso que seremos conhecidos agora!
Temos um governo que nos está a desafiar para sair à rua. Um desafio para mostrarmos a massa de que somos feitos. Este governo desafia-nos, olhos nos olhos. Desafia-nos nas palavras e nos actos! Não podemos mais olhar para o lado. Está na hora de, também nós, os olharmos nos olhos. Olhar nos olhos um governo que se esconde atrás da troika. Um governo que se esconde atrás da culpa de outros, a liturgia gasta da pesada herança, nunca a culpa é deles. Um governo que falha, erra, mente, mas que nos quer convencer que sempre disse a verdade e nada mais do que a verdade.
Um Primeiro-ministro que às 7:20 da tarde “sofre” enquanto fala ao país, mas que às 8 já canta, não me merece respeito.
Abriram a porta do nosso país a uma quadrilha de agiotas que nos veio saquear e pilhar, não vieram ajudar.
O mais perigoso ladrão é o que entra em nossa casa pela porta de frente, convidado, como se fosse nosso amigo. Um amigo não cobra 34,4 mil milhões por um empréstimo de 78 mil milhões!! A agiotagem travestida de solidariedade. E é suposto agradecermos!
Pelo menos permitam-nos que chamemos os bois pelos nomes! E é isso que faremos no próximo dia 15 de Setembro. Recuperar a nossa dignidade, o nosso orgulho, as nossas vidas que estão sob sequestro, por parte desta gente sinistra que entrou em nossa casa, convidada por gente ainda mais sinistra.
Mudança? Talvez começar por eleger Portugueses que governem a pensar no bem estar de nós todos, e não governem no intereresse da oligarquia arrogante, parasita, mais ou menos oculta, que nos governa desde sempre. Seria, finalmente, um bom começo. Esse será o amanhã pelo qual todos teremos que lutar!
Não é hora de ficar em casa. Espero ter muita gente na rua no próximo dia 15. Mas mesmo que sejamos poucos, vamos insistir, insistir, insistir até ao dia em que seremos muitos, o dia em que eles não vão conseguir deixar de nos ver!
Olhei para o lado, e vi gente com alma, gente ao lado da qual me orgulho de caminhar. Junta-te a nós!
RICARDO MORTE
Um só Povo, um só Mar
Na praia do Pedrógão um Grupo de pescadores luta todos os dias para manter viva a arte xávega. Este é um Pequeno documentário sobre o Mar, os Pescadores e sobre NÓS mesmos, Portugueses.
Napoleão entrou em Moscovo no dia 14 de setembro.
Campanha da Rússia, um colossal revés para Napoleão
Nas vastas planícies geladas do Leste Europeu, o exército do imperador conheceu o gosto amargo da derrota: embora vitorioso do ponto de vista militar, sucumbiu na retaguarda
por J. Lucas-Dubreton
O czar Alexandre e o imperador Napoleão, acumulando mágoas recíprocas, passaram a trocar farpas que anunciavam a guerra. Entre os principais pontos de discórdia estava o bloqueio continental imposto pela França, em 1806. Obrigado, por acordo de 1807, a fechar suas fronteiras ao comércio inglês, o czar se viu assediado pelas queixas dos grandes proprietários do império, que, sem poder exportar para a Inglaterra - seu principal mercado - os produtos da terra e das minas, puseram-se a anunciar a ruína. Alexandre, que tudo faria para evitar uma guerra com os súditos, reabriu parcialmente as fronteiras, favoreceu o comércio dos neutros e gravou as mercadorias francesas com taxas quase proibitivas: a seda, o vinho, os bens de luxo.
Essas medidas afetaram a França sobretudo porque, naquele momento (início de 1811), sua indústria atravessava uma crise grave, e, para lhe compensar o efeito, Napoleão anexou as cidades hanseáticas, Bremen, Hamburgo, assim como Oldemburgo, pertencentes ao cunhado de Alexandre, o que suscitou novas queixas.
"O arco está tenso há muito tempo", disse Napoleão, e não seria em São Petersburgo que ele se flexionaria. Ele não queria a guerra, mas, a partir do momento em que se viu sozinho contra Alexandre, que violara acordos e tomara o partido da Inglaterra, o conflito tornou-se inevitável. Além disso, o czar sabia como enfrentar as forças do adversário. Por meio de espionagem, seus colaboradores descobriram a posição das tropas francesas na Alemanha e o quadro de seus movimentos; ao mesmo tempo, receberam informações sobre o melhor método de se impor ao inimigo: evitar os grandes confrontos, fustigá-lo com marchas e contramarchas.
Napoleão, por sua vez, tinha um plano bem claro: avançar rapidamente em território russo, obrigar Alexandre a combater, fazê-lo recuar até a antiga Moscóvia, desvincular da Rússia a Polônia, que serviria de fronteira para a Alemanha, restaurar sua autoridade e, assim, completar o sistema continental.
Caráter sagrado da missão
Mas foi sem entusiasmo, com uma espécie de melancolia até, que se envolveu nessa guerra contra "a montanha de neve". A Pasquier, seu chefe de polícia, que lhe chamou a atenção para a penúria nos departamentos, ele respondeu: "É só mais uma dificuldade somada às tantas que tenho de enfrentar na maior das empresas, na mais difícil a que me lancei". A alguém que lhe expôs a triste situação do exército na Espanha, ele dissera: "Vou me embrenhar com meus numerosos exércitos num grande país que nada produz (...)" e, a seguir: "Mas qual será o fim disso?".
Na mesma época, a polícia acabava de prender um jovem saxão que havia tentado assassinar o imperador em um baile de máscaras na casa do ministro das Relações Exteriores da Itália. O atentado deu margem à exasperação do patriotismo alemão e não faltou quem, mesmo entre os militares, aconselhasse, prudentemente, que a França evitasse a guerra, na presunção de que a ruína poderia não se deter nas fronteiras do reino. Napoleão tratava de aparentar a mais plena liberdade de espírito, mas chegou o momento do impasse. "Eu compreendi", escreveu ele ao czar, cujo ultimato data de 27 de abril de 1812, "que a sorte foi lançada e que essa Providência invisível, cujos direitos e cujo império eu reconheço, decidiu esta questão, assim como tantas outras."
Curioso exército foi aquele que transpôs o Niemen, em Kovno, em junho de 1812, uma babel de nações. Havia portugueses, poloneses, italianos, croatas e dálmatas.
Na ala esquerda, os prussianos marchavam rumo ao Báltico, na direita, os austríacos na direção de Pinsk. No momento de atravessar o rio, quando Napoleão galopava pelo trigal, uma lebre correu entre as patas de seu cavalo. Derrubado, o imperador rolou no chão; pesado que estava, precisou de ajuda para tornar a montar. Não tardou a se recompor, mas o incidente o entristeceu. Ao redor, houve quem antevisse, no tombo, um "mau presságio". A realidade seria mais contundente. Eles passaram sem ser importunados pelo inimigo em retirada, e o avanço se iniciou em meio a um calor tórrido, num país deserto. Ao calor, sucedeu-se uma chuva torrencial, que arruinou os caminhos. Os cavalos começaram a morrer, a empestear o ar.
Com o chapéu e a sobrecasaca cinzenta ensopados, Napoleão reconhecia que o tempo estava péssimo; mas, quando um general o avisou que as marchas demasiado longas estavam esmagando a cavalaria, ele não fez caso. Alcançar os russos, obrigá-los a combater, essa era a única coisa em que pensava.
Exausto, o exército chegou a Vitebsk; a prudência recomendava deter-se e reorganizar os regimentos: já se havia perdido um sexto do efetivo, e a superioridade numérica sobre os russos diminuía dia a dia. Mas Napoleão, fiel a uma ideia fixa, ordenou que avançassem sem demora, e seu mau humor se voltou contra os serviços de saúde e de logística: "Os senhores não se mostram muito ativos, caros doutores e comissários de abastecimento; vou mandá-los a Paris cuidar dos moradores do Palais-Royal. Não compreendem o caráter sagrado da sua missão". E, de fato, a carência de tais serviços foi uma das causas do desastre.
Surgiram, no horizonte, os campanários e as cúpulas da sagrada Smolensk, o bulevar de Moscou, aquela de que diziam os russos: "No dia em que Smolensk cair, o czar será destronado". Na nuvem de poeira, Napoleão distinguiu longas colunas negras, nas quais brilhava o reflexo das baionetas: era todo o exército russo. Tomado de alegria, exclamou: "Eu os peguei!". Ledo engano. Os russos ofereciam resistência, mas se furtavam ao combate, e o Grande Exército acabou entrando numa cidade em chamas. O imperador podia explicar que era àquilo que se havia reduzido a Rússia: só tinha força para assistir à queda de suas cidades, mas não para defendê-las; e se animou "apesar dos próprios fatos". Seus colaboradores não estavam otimistas e, com razão, lembravam que a estação quente terminaria em setembro. "Vocês nasceram numa barraca", respondeu o imperador, "nela hão de morrer."
Seu despotismo se estendia a tudo; ele queria tudo fazer, tudo ordenar; ninguém - nem mesmo o major-general - se atrevia a assumir a responsabilidade por uma medida, ainda que a mais insignificante; e as coisas não melhoravam. Chegaram a Viazma e a encontraram em chamas, como Smolensk. Napoleão gracejou: "Essa gente põe fogo em suas próprias casas só para nos impedir de nelas passar uma noite". Enfim, no início de setembro, em Borodino, à beira de um pequeno afluente do rio Moscova, ele deparou com o exército inimigo entrincheirado numa posição formidável, bloqueando a estrada de Moscovo.
As forças russas, comandadas por Mikhail M. Kutuzov, eram quase tão numerosas quanto as francesas, e, no dia 7 de setembro, houve o confronto. Somente uma manobra; um ataque frontal obstinado, enfurecido, no qual os franceses se impuseram pela bravura. Às 5 horas da tarde, o inimigo se retirou em boa ordem, e as perdas francesas foram tão pesadas que Napoleão se absteve de persegui-lo. Na véspera, ele tivera o seguinte diálogo com M. de Narbonne, um dos nobres ligados ao império: "O senhor nunca viu uma batalha?". A resposta. "Sire, eu não tive essa honra", foi a resposta. E ele concluiu: "É uma coisa grandiosa, uma tragédia terrível". E citou as etapas: exposição, peripécias, desenlace. No entardecer do Moscova, enquanto os russos se retiravam sem ser incomodados, ele tornou a se encontrar com Narbonne e disse: "Pois é, não tivemos o último ato!". Com efeito, não houvera desfecho algum. "Os russos se deixam matar feito máquinas. Isso não me ajuda em nada." Mas a estrada de Moscovo estava livre...
Napoleão entrou em Moscovo no dia 14 de setembro. "Ei-la, enfim, esta cidade tão célebre!", exclamou. E acrescentou: "Já não era sem tempo." Negociar com o czar, pelo menos refazer seu exército, essa era sua esperança, esse o seu projeto. Na noite seguinte, irrompeu um incêndio que, empurrado pelo vento do oeste, espalhou-se pela cidade, deitando tanta claridade "que era possível ler encerrado num quarto sem luz". Napoleão o atribuiu a uma imprudência das tropas, mas, depois que alguns agentes da polícia russa foram interrogados, deve ter se rendido à evidência: Moscou havia sido incendiada por ordem do governador, que tivera o cuidado de retirar as bombas de água antes de evacuar a cidade.
Demora fatal
O incêndio continuava se alastrando. Já ameaçava o arsenal. Foi preciso implorar ao imperador que se afastasse, pois a sua presença levava os soldados da guarda a perderem o sangue-frio, temendo por ele. O fogo durou quatro dias. Apesar das ruínas, da pilhagem das tropas, dos escravos russos que permaneceram na cidade, da desmoralização, Napoleão perdeu quatro semanas em Moscou, as quais depois lamentaria amargamente. Viu múltiplas vantagens nessa permanência, inclusive alimentar seu exército e beneficiar-se do efeito moral da ocupação; mas não confessou o temor de que um recuo viesse a lhe prejudicar o prestígio.
A maioria de seus marechais desejava o retorno. O czar, por sua vez, estava tão pouco disposto a negociar que proibiu os enviados do imperador de transpor as linhas: "A minha campanha ainda vai começar", dizia. Notícias sinistras, de invasões, chegavam da Espanha. E, como se isso não bastasse, os destacamentos cossacos - os "urras" - começaram a ameaçar a retaguarda do exército. Em 18 de outubro, depois de explodir o Kremlin, Napoleão se conformou em bater em retirada; restavam-lhe cerca de 100 mil homens e 500 canhões.
Durante um mês e meio, sem ter idéia dos movimentos do inimigo, atacado de surpresa por todos os lados, morrendo de fome e de frio, arrastando uma multidão de doentes e feridos, o exército foi perdendo, pouco a pouco, os canhões, as montarias, as carroças, e só chegaria à fronteira da Prússia na forma de um espectro. "Imagine um homem no alto de uma escada de cem degraus", disse o teórico Joseph de Maistre, "e, ao longo de toda essa escada, homens aglomerados à direita e à esquerda, todos com machados e maças, prontos para esmagar a máquina; é a imagem natural da situação em que Napoleão se acha."
A insegurança era tal que, no dia 25 de outubro, por pouco o próprio imperador não caiu no meio de um grupo de cossacos. Foi questão de minutos; mas, sem perder o sangue-frio, ele encarava a derrota com uma clarividência que não se desmentiu: "Ficaremos sem notícias da França", disse, "mas o pior é que a França ficará sem notícias nossas". Nas proximidades de Orcha, uma bala inimiga caiu perto dele; Napoleão a empurrou com o chicote. Supersticioso, tinha confiança na sua estrela, fazia projetos para o futuro como se estivesse às portas de Paris - ditou, em Moscovo, o regulamento da Comédie Française.
Entretanto, nas estradas geladas, luzidias como espelhos, os cavalos tombavam, obrigando-os a abandonar as carroças que transportavam o tesouro. Do norte chegava um vento gelado, capaz de queimar; o cano do fuzil grudava nas mãos, a pele inchava, cheia de bolhas; e as extremidades dos dedos, duras e descoradas, pareciam bolas de marfim. Cobertos de andrajos, os olhos injetados, o rosto tumefato, infestados de vermes - fazia três meses que não trocavam de farda nem de roupa de baixo -, os antigos vencedores da Europa lutavam contra a agonia. Se adormecessem, era a morte; se resistissem, se um passante os arrastasse um pouco mais adiante, ela estava apenas adiada. Os mais fracos morriam primeiro, o sangue na boca e, antes mesmo que expirassem, seus camaradas já os haviam despido.
Oceano de barbárie
"Nunca", disse uma testemunha, "há de ter havido semelhante trajetória de cadáveres na extensão da que seguiram os que fizeram essa campanha; eles estão em todos os cantos, em todas as estradas, frescos e velhos." A natureza humana, exaurida, desgastada pelo sofrimento, punha "sua trama a nu, sua fibra fundamental"; já não havia hierarquia nem disciplina; só um egoísmo feroz, "um oceano de barbárie"; todos curvados sob o mesmo nível de miséria. A própria velha guarda tinha perdido a bela compostura, e Napoleão se viu obrigado a chamá-la à ordem: "Não dêem ouvidos a esses fracos que a desgraça abate e que não sabem sofrer. Façam justiça, pelas próprias mãos, com aqueles que, dentre vocês, saírem da fila durante a marcha.
Estabeleçam uma disciplina interior em cada companhia, e que os homens que se comportarem mal sejam apedrejados pelos camaradas".
Aliás, coragem era o que não faltava. Foram homens semimortos de fome e frio que abriram caminho à força sobre o Berezina. O inimigo havia queimado a ponte, e a situação parecia desesperadora: um exército russo na retaguarda, um segundo do outro lado do Berezina, um terceiro chegando do norte. O que restava do Grande Exército seguiu em frente, com exceção de uma horda de 10 mil a 12 mil homens, que não quiseram atravessar quando era possível: um peso a menos enfim, um alívio para a retirada, ocorrida entre 25 e 29 de novembro de 1812.
Dias depois, Napoleão abandonou as tropas. Em Dorogobuge, com um frio de 18 graus negativos, ele recebeu uma notícia estarrecedora: em Paris, o general Malet, um recidivista da rebelião, havia tentado depor o governo, anunciando a morte do imperador. A impostura não tardou a ser descoberta; os culpados foram castigados; e o golpista, mesmo assim, exibiu arrogância no tribunal em que foi julgado. "O senhor tem cúmplices?", perguntou-lhe o juiz. "Tenho. A França e o senhor, caso eu tivesse sido bem-sucedido." Essa tentativa frustrada impressionou muito o imperador.
Ele mesmo refletiu, a partir desse fato, no que consistia seu poder, se bastava um simples boato anunciando sua morte para que tudo estivesse a ponto de ruir. "Com os franceses, assim como com as mulheres, não convém passar muito tempo ausente. Já sabemos (...) o que aconteceria se eles ficassem algum tempo sem notícias minhas", comentou.
Na verdade, essa ausência foi o fim do exército. O comandante que assumiu seu posto abandonou Vilna sem nenhuma defesa. Heróis de antigas batalhas tiveram de safar-se puxando os próprios cavalos pelas rédeas. E os prussianos viram esboroar-se em seu país, no mês de junho, os escombros daquele exército tão belo: transformou-se em uma espécie de grotesca mascarada, em que generais e oficiais se arrastavam vestindo roupas de operários, batinas de padre, casacos de mulher.
Todos completamente descompostos, desfigurados, de barba comprida, tão famintos que se precipitavam com voracidade sobre pedaços de pão duro que lhes ofereciam.
Então a atitude para com eles se alterou completamente; os patriotas prussianos começaram a dar vazão ao ódio contido durante tanto tempo, diante da esperança de uma revanche iminente; ao que os franceses respondem: "O leão está doente, mas não morto!". No entanto, o desastre ainda não chegara ao fim: um general prussiano que combatia nas fileiras francesas e estava encarregado de apoiar o movimento da ala esquerda em direção a Riga fez um acordo com o czar, e a sua defecção abriu caminho para os russos. Dali por diante, o combate já não seria na outra margem do Niemen.
Na França, reinava a inquietude. "No campo, tudo era dor e medo; na cidade, apreensão e descontentamento; os protestos ressoavam em Paris." Desde a crise de 1811, o custo de vida vinha aumentando, o dinheiro tornava-se cada vez mais escasso; a burguesia temia já não encontrar substitutos para seus filhos convocados para o serviço militar, os republicanos pensavam em tirar proveito da situação e se unir aos realistas. Napoleão decidiu nada ocultar do desastre: "Vou contar tudo. É melhor que saibam desses detalhes por mim do que por cartas particulares (...)."
E, de fato, em 3 de dezembro, quando foi publicado o 29º boletim do Grande Exército, a opinião pública ficou consternada: "Mais de 30 mil cavalos pereceram em poucos dias (...). Sem cavalaria, não podíamos avançar mais do que um quarto de légua; entretanto, sem artilharia, não podíamos arriscar uma batalha e ficar plantados, esperando; precisávamos marchar para não ser forçados a travar um combate que a falta de munição nos impedia de desejar (...)".
Não obstante, o imperador, com um séquito que não seria capaz de proteger nem mesmo um jovem abastado que fizesse uma viagem de recreio, atravessou territórios em que o nome francês era execrado. Fácil seria um assassinato, uma emboscada, ele sabia, mas não se deixou intimidar e comentou livremente sua derrota. "Foi a Inglaterra que me empurrou, que me obrigou a fazer tudo quanto fiz", disse ele. "Se ela não tivesse rompido o Tratado de Amiens, se não tivesse feito a paz depois de Austerlitz, depois de Tilsit, eu teria ficado em casa tranqüilamente (...). Só me teria ocupado da prosperidade interna (...). Não sou mais inimigo do que qualquer outra pessoa dos prazeres da vida. Não sou um Dom Quixote com necessidade de sair em busca de aventuras."
Seu regresso a Paris foi aclamado com emoção pelos adeptos, que tinham os corações novamente abertos para a esperança. A confiança e a segurança renasceram: afinal, ele, o imperador, estava de volta. Napoleão, por sua vez, abalado pela notícia dos últimos desastres do exército avaliava a situação: "O frio fez com que todo mundo perdesse a cabeça (...). Aquilo que cem homens corajosos teriam salvo perdeu-se diante do nariz de vários milhares de bravos (...)". Pouco a pouco, o que restava desses bravos foi retornando à França; ele os passou em revista perto do Trianon. Um regimento de 1.500 homens ficou reduzido ao coronel e a alguns oficiais e suboficiais; o imperador se dirigiu a um deles, perguntando-lhe a idade: 21 anos.
"Todo o regimento era dessa idade", esclareceu o coronel. E em seguida lamentou: "Foram sobretudo os jovens que sofreram".
A tristeza se estampou no rosto de Napoleão: "Os homens comuns sucumbiram", comentou, "os homens de ferro foram feitos prisioneiros; eu trouxe comigo homens de bronze". Não havia cálculos de quantos realmente tinham regressado com ele. No seu próprio balanço, foi realista: "A guerra da Rússia foi um péssimo negócio. Eu me enganei, não quanto ao objetivo e à oportunidade política dessa guerra, mas quanto à maneira de fazê-la (...). Estive em Moscou. Acreditei que assinaria a paz. Passei muito tempo lá. Esperava obter em uma campanha o que se devia executar em duas.
Cometi um grande erro, mas terei meios de repará-lo". O imperador mostrava confiança, mas o dobre de finados do império já estava começando a tocar.
O horror, na retirada em Berezina
Entre as passagens mais dramáticas da retirada, na campanha da Rússia, está a travessia do Berezina, em 25 de novembro de 1812. Formados do lado direito do caminho para Borissov, cidade às margens desse rio, os 20 mil homens do corpo de reserva aguardavam o Grande Exército. Napoleão deixara Moscovo em 19 de outubro.
Os soldados - artilharia e cavalaria intactas - esperavam. De súbito, apareceu uma fileira de espectros recobertos de barro, trajando vestes inomináveis. Andavam em silêncio. Seguiam-se viaturas desengonçadas, cheias de feridos. Era o que restara do Grande Exército. Na margem direita do rio Berezina e na esquerda - o lado em que se encontrava Napoleão - 120 mil russos iriam juntar suas forças, fechando o bote.
Napoleão contaria com não mais de 30 mil combatentes realmente aptos. Parecia impossível que o Grande Exército conseguiria escapar. Na noite de 25 de novembro, o imperador examinara a ponte de Borissov, que apresentava rupturas em três pontos. Em frente, na margem direita, as baterias do almirante Tchitchakov mantinham sob fogo pesado o local. Ninguém pensava em fazer a travessia ali, mas havia que iludir os russos quanto a uma tentativa de reconstrução da obra, enquanto se fazia uma outra passagem. Um oficial descobriu que havia uma opção, a cinco léguas de Borissov, na aldeia de Studianka, onde poderia ser erguida uma ponte sobre cavaletes. Assim foi feito. Os russos caíram no ardil. Napoleão garantiu a margem direita, com 400 homens. Na manhã do dia 26, a ponte ficou pronta e os soldados começaram a atravessar. A maioria, porém, recusou-se a fazê-lo, animada por encontrar na aldeia pão e madeira para fogo. Quando o dia amanheceu - 27 de novembro - os retardatários apressaram-se. Todos queriam passar ao mesmo tempo.
Muitos foram pisoteados, outros caíram para a morte nas águas gélidas do Berezina, sob um frio de 20 graus negativos. Em outros pontos, unidades tratavam de conter as dos russos, sem nenhuma ajuda. No dia 28 outras levas passaram. Em 29 de novembro, os que restaram fizeram o caminho em pânico, sob a temperatura que caíra a 30 graus negativos. Alguns dias mais tarde, em 5 de dezembro, em Smorgoni, o imperador deixaria a horda para retornar a Paris.
Nas vastas planícies geladas do Leste Europeu, o exército do imperador conheceu o gosto amargo da derrota: embora vitorioso do ponto de vista militar, sucumbiu na retaguarda
por J. Lucas-Dubreton
O czar Alexandre e o imperador Napoleão, acumulando mágoas recíprocas, passaram a trocar farpas que anunciavam a guerra. Entre os principais pontos de discórdia estava o bloqueio continental imposto pela França, em 1806. Obrigado, por acordo de 1807, a fechar suas fronteiras ao comércio inglês, o czar se viu assediado pelas queixas dos grandes proprietários do império, que, sem poder exportar para a Inglaterra - seu principal mercado - os produtos da terra e das minas, puseram-se a anunciar a ruína. Alexandre, que tudo faria para evitar uma guerra com os súditos, reabriu parcialmente as fronteiras, favoreceu o comércio dos neutros e gravou as mercadorias francesas com taxas quase proibitivas: a seda, o vinho, os bens de luxo.
Essas medidas afetaram a França sobretudo porque, naquele momento (início de 1811), sua indústria atravessava uma crise grave, e, para lhe compensar o efeito, Napoleão anexou as cidades hanseáticas, Bremen, Hamburgo, assim como Oldemburgo, pertencentes ao cunhado de Alexandre, o que suscitou novas queixas.
"O arco está tenso há muito tempo", disse Napoleão, e não seria em São Petersburgo que ele se flexionaria. Ele não queria a guerra, mas, a partir do momento em que se viu sozinho contra Alexandre, que violara acordos e tomara o partido da Inglaterra, o conflito tornou-se inevitável. Além disso, o czar sabia como enfrentar as forças do adversário. Por meio de espionagem, seus colaboradores descobriram a posição das tropas francesas na Alemanha e o quadro de seus movimentos; ao mesmo tempo, receberam informações sobre o melhor método de se impor ao inimigo: evitar os grandes confrontos, fustigá-lo com marchas e contramarchas.
Napoleão, por sua vez, tinha um plano bem claro: avançar rapidamente em território russo, obrigar Alexandre a combater, fazê-lo recuar até a antiga Moscóvia, desvincular da Rússia a Polônia, que serviria de fronteira para a Alemanha, restaurar sua autoridade e, assim, completar o sistema continental.
Caráter sagrado da missão
Mas foi sem entusiasmo, com uma espécie de melancolia até, que se envolveu nessa guerra contra "a montanha de neve". A Pasquier, seu chefe de polícia, que lhe chamou a atenção para a penúria nos departamentos, ele respondeu: "É só mais uma dificuldade somada às tantas que tenho de enfrentar na maior das empresas, na mais difícil a que me lancei". A alguém que lhe expôs a triste situação do exército na Espanha, ele dissera: "Vou me embrenhar com meus numerosos exércitos num grande país que nada produz (...)" e, a seguir: "Mas qual será o fim disso?".
Na mesma época, a polícia acabava de prender um jovem saxão que havia tentado assassinar o imperador em um baile de máscaras na casa do ministro das Relações Exteriores da Itália. O atentado deu margem à exasperação do patriotismo alemão e não faltou quem, mesmo entre os militares, aconselhasse, prudentemente, que a França evitasse a guerra, na presunção de que a ruína poderia não se deter nas fronteiras do reino. Napoleão tratava de aparentar a mais plena liberdade de espírito, mas chegou o momento do impasse. "Eu compreendi", escreveu ele ao czar, cujo ultimato data de 27 de abril de 1812, "que a sorte foi lançada e que essa Providência invisível, cujos direitos e cujo império eu reconheço, decidiu esta questão, assim como tantas outras."
Curioso exército foi aquele que transpôs o Niemen, em Kovno, em junho de 1812, uma babel de nações. Havia portugueses, poloneses, italianos, croatas e dálmatas.
Na ala esquerda, os prussianos marchavam rumo ao Báltico, na direita, os austríacos na direção de Pinsk. No momento de atravessar o rio, quando Napoleão galopava pelo trigal, uma lebre correu entre as patas de seu cavalo. Derrubado, o imperador rolou no chão; pesado que estava, precisou de ajuda para tornar a montar. Não tardou a se recompor, mas o incidente o entristeceu. Ao redor, houve quem antevisse, no tombo, um "mau presságio". A realidade seria mais contundente. Eles passaram sem ser importunados pelo inimigo em retirada, e o avanço se iniciou em meio a um calor tórrido, num país deserto. Ao calor, sucedeu-se uma chuva torrencial, que arruinou os caminhos. Os cavalos começaram a morrer, a empestear o ar.
Com o chapéu e a sobrecasaca cinzenta ensopados, Napoleão reconhecia que o tempo estava péssimo; mas, quando um general o avisou que as marchas demasiado longas estavam esmagando a cavalaria, ele não fez caso. Alcançar os russos, obrigá-los a combater, essa era a única coisa em que pensava.
Exausto, o exército chegou a Vitebsk; a prudência recomendava deter-se e reorganizar os regimentos: já se havia perdido um sexto do efetivo, e a superioridade numérica sobre os russos diminuía dia a dia. Mas Napoleão, fiel a uma ideia fixa, ordenou que avançassem sem demora, e seu mau humor se voltou contra os serviços de saúde e de logística: "Os senhores não se mostram muito ativos, caros doutores e comissários de abastecimento; vou mandá-los a Paris cuidar dos moradores do Palais-Royal. Não compreendem o caráter sagrado da sua missão". E, de fato, a carência de tais serviços foi uma das causas do desastre.
Surgiram, no horizonte, os campanários e as cúpulas da sagrada Smolensk, o bulevar de Moscou, aquela de que diziam os russos: "No dia em que Smolensk cair, o czar será destronado". Na nuvem de poeira, Napoleão distinguiu longas colunas negras, nas quais brilhava o reflexo das baionetas: era todo o exército russo. Tomado de alegria, exclamou: "Eu os peguei!". Ledo engano. Os russos ofereciam resistência, mas se furtavam ao combate, e o Grande Exército acabou entrando numa cidade em chamas. O imperador podia explicar que era àquilo que se havia reduzido a Rússia: só tinha força para assistir à queda de suas cidades, mas não para defendê-las; e se animou "apesar dos próprios fatos". Seus colaboradores não estavam otimistas e, com razão, lembravam que a estação quente terminaria em setembro. "Vocês nasceram numa barraca", respondeu o imperador, "nela hão de morrer."
Seu despotismo se estendia a tudo; ele queria tudo fazer, tudo ordenar; ninguém - nem mesmo o major-general - se atrevia a assumir a responsabilidade por uma medida, ainda que a mais insignificante; e as coisas não melhoravam. Chegaram a Viazma e a encontraram em chamas, como Smolensk. Napoleão gracejou: "Essa gente põe fogo em suas próprias casas só para nos impedir de nelas passar uma noite". Enfim, no início de setembro, em Borodino, à beira de um pequeno afluente do rio Moscova, ele deparou com o exército inimigo entrincheirado numa posição formidável, bloqueando a estrada de Moscovo.
As forças russas, comandadas por Mikhail M. Kutuzov, eram quase tão numerosas quanto as francesas, e, no dia 7 de setembro, houve o confronto. Somente uma manobra; um ataque frontal obstinado, enfurecido, no qual os franceses se impuseram pela bravura. Às 5 horas da tarde, o inimigo se retirou em boa ordem, e as perdas francesas foram tão pesadas que Napoleão se absteve de persegui-lo. Na véspera, ele tivera o seguinte diálogo com M. de Narbonne, um dos nobres ligados ao império: "O senhor nunca viu uma batalha?". A resposta. "Sire, eu não tive essa honra", foi a resposta. E ele concluiu: "É uma coisa grandiosa, uma tragédia terrível". E citou as etapas: exposição, peripécias, desenlace. No entardecer do Moscova, enquanto os russos se retiravam sem ser incomodados, ele tornou a se encontrar com Narbonne e disse: "Pois é, não tivemos o último ato!". Com efeito, não houvera desfecho algum. "Os russos se deixam matar feito máquinas. Isso não me ajuda em nada." Mas a estrada de Moscovo estava livre...
Napoleão entrou em Moscovo no dia 14 de setembro. "Ei-la, enfim, esta cidade tão célebre!", exclamou. E acrescentou: "Já não era sem tempo." Negociar com o czar, pelo menos refazer seu exército, essa era sua esperança, esse o seu projeto. Na noite seguinte, irrompeu um incêndio que, empurrado pelo vento do oeste, espalhou-se pela cidade, deitando tanta claridade "que era possível ler encerrado num quarto sem luz". Napoleão o atribuiu a uma imprudência das tropas, mas, depois que alguns agentes da polícia russa foram interrogados, deve ter se rendido à evidência: Moscou havia sido incendiada por ordem do governador, que tivera o cuidado de retirar as bombas de água antes de evacuar a cidade.
Demora fatal
O incêndio continuava se alastrando. Já ameaçava o arsenal. Foi preciso implorar ao imperador que se afastasse, pois a sua presença levava os soldados da guarda a perderem o sangue-frio, temendo por ele. O fogo durou quatro dias. Apesar das ruínas, da pilhagem das tropas, dos escravos russos que permaneceram na cidade, da desmoralização, Napoleão perdeu quatro semanas em Moscou, as quais depois lamentaria amargamente. Viu múltiplas vantagens nessa permanência, inclusive alimentar seu exército e beneficiar-se do efeito moral da ocupação; mas não confessou o temor de que um recuo viesse a lhe prejudicar o prestígio.
A maioria de seus marechais desejava o retorno. O czar, por sua vez, estava tão pouco disposto a negociar que proibiu os enviados do imperador de transpor as linhas: "A minha campanha ainda vai começar", dizia. Notícias sinistras, de invasões, chegavam da Espanha. E, como se isso não bastasse, os destacamentos cossacos - os "urras" - começaram a ameaçar a retaguarda do exército. Em 18 de outubro, depois de explodir o Kremlin, Napoleão se conformou em bater em retirada; restavam-lhe cerca de 100 mil homens e 500 canhões.
Durante um mês e meio, sem ter idéia dos movimentos do inimigo, atacado de surpresa por todos os lados, morrendo de fome e de frio, arrastando uma multidão de doentes e feridos, o exército foi perdendo, pouco a pouco, os canhões, as montarias, as carroças, e só chegaria à fronteira da Prússia na forma de um espectro. "Imagine um homem no alto de uma escada de cem degraus", disse o teórico Joseph de Maistre, "e, ao longo de toda essa escada, homens aglomerados à direita e à esquerda, todos com machados e maças, prontos para esmagar a máquina; é a imagem natural da situação em que Napoleão se acha."
A insegurança era tal que, no dia 25 de outubro, por pouco o próprio imperador não caiu no meio de um grupo de cossacos. Foi questão de minutos; mas, sem perder o sangue-frio, ele encarava a derrota com uma clarividência que não se desmentiu: "Ficaremos sem notícias da França", disse, "mas o pior é que a França ficará sem notícias nossas". Nas proximidades de Orcha, uma bala inimiga caiu perto dele; Napoleão a empurrou com o chicote. Supersticioso, tinha confiança na sua estrela, fazia projetos para o futuro como se estivesse às portas de Paris - ditou, em Moscovo, o regulamento da Comédie Française.
Entretanto, nas estradas geladas, luzidias como espelhos, os cavalos tombavam, obrigando-os a abandonar as carroças que transportavam o tesouro. Do norte chegava um vento gelado, capaz de queimar; o cano do fuzil grudava nas mãos, a pele inchava, cheia de bolhas; e as extremidades dos dedos, duras e descoradas, pareciam bolas de marfim. Cobertos de andrajos, os olhos injetados, o rosto tumefato, infestados de vermes - fazia três meses que não trocavam de farda nem de roupa de baixo -, os antigos vencedores da Europa lutavam contra a agonia. Se adormecessem, era a morte; se resistissem, se um passante os arrastasse um pouco mais adiante, ela estava apenas adiada. Os mais fracos morriam primeiro, o sangue na boca e, antes mesmo que expirassem, seus camaradas já os haviam despido.
Oceano de barbárie
"Nunca", disse uma testemunha, "há de ter havido semelhante trajetória de cadáveres na extensão da que seguiram os que fizeram essa campanha; eles estão em todos os cantos, em todas as estradas, frescos e velhos." A natureza humana, exaurida, desgastada pelo sofrimento, punha "sua trama a nu, sua fibra fundamental"; já não havia hierarquia nem disciplina; só um egoísmo feroz, "um oceano de barbárie"; todos curvados sob o mesmo nível de miséria. A própria velha guarda tinha perdido a bela compostura, e Napoleão se viu obrigado a chamá-la à ordem: "Não dêem ouvidos a esses fracos que a desgraça abate e que não sabem sofrer. Façam justiça, pelas próprias mãos, com aqueles que, dentre vocês, saírem da fila durante a marcha.
Estabeleçam uma disciplina interior em cada companhia, e que os homens que se comportarem mal sejam apedrejados pelos camaradas".
Aliás, coragem era o que não faltava. Foram homens semimortos de fome e frio que abriram caminho à força sobre o Berezina. O inimigo havia queimado a ponte, e a situação parecia desesperadora: um exército russo na retaguarda, um segundo do outro lado do Berezina, um terceiro chegando do norte. O que restava do Grande Exército seguiu em frente, com exceção de uma horda de 10 mil a 12 mil homens, que não quiseram atravessar quando era possível: um peso a menos enfim, um alívio para a retirada, ocorrida entre 25 e 29 de novembro de 1812.
Dias depois, Napoleão abandonou as tropas. Em Dorogobuge, com um frio de 18 graus negativos, ele recebeu uma notícia estarrecedora: em Paris, o general Malet, um recidivista da rebelião, havia tentado depor o governo, anunciando a morte do imperador. A impostura não tardou a ser descoberta; os culpados foram castigados; e o golpista, mesmo assim, exibiu arrogância no tribunal em que foi julgado. "O senhor tem cúmplices?", perguntou-lhe o juiz. "Tenho. A França e o senhor, caso eu tivesse sido bem-sucedido." Essa tentativa frustrada impressionou muito o imperador.
Ele mesmo refletiu, a partir desse fato, no que consistia seu poder, se bastava um simples boato anunciando sua morte para que tudo estivesse a ponto de ruir. "Com os franceses, assim como com as mulheres, não convém passar muito tempo ausente. Já sabemos (...) o que aconteceria se eles ficassem algum tempo sem notícias minhas", comentou.
Na verdade, essa ausência foi o fim do exército. O comandante que assumiu seu posto abandonou Vilna sem nenhuma defesa. Heróis de antigas batalhas tiveram de safar-se puxando os próprios cavalos pelas rédeas. E os prussianos viram esboroar-se em seu país, no mês de junho, os escombros daquele exército tão belo: transformou-se em uma espécie de grotesca mascarada, em que generais e oficiais se arrastavam vestindo roupas de operários, batinas de padre, casacos de mulher.
Todos completamente descompostos, desfigurados, de barba comprida, tão famintos que se precipitavam com voracidade sobre pedaços de pão duro que lhes ofereciam.
Então a atitude para com eles se alterou completamente; os patriotas prussianos começaram a dar vazão ao ódio contido durante tanto tempo, diante da esperança de uma revanche iminente; ao que os franceses respondem: "O leão está doente, mas não morto!". No entanto, o desastre ainda não chegara ao fim: um general prussiano que combatia nas fileiras francesas e estava encarregado de apoiar o movimento da ala esquerda em direção a Riga fez um acordo com o czar, e a sua defecção abriu caminho para os russos. Dali por diante, o combate já não seria na outra margem do Niemen.
Na França, reinava a inquietude. "No campo, tudo era dor e medo; na cidade, apreensão e descontentamento; os protestos ressoavam em Paris." Desde a crise de 1811, o custo de vida vinha aumentando, o dinheiro tornava-se cada vez mais escasso; a burguesia temia já não encontrar substitutos para seus filhos convocados para o serviço militar, os republicanos pensavam em tirar proveito da situação e se unir aos realistas. Napoleão decidiu nada ocultar do desastre: "Vou contar tudo. É melhor que saibam desses detalhes por mim do que por cartas particulares (...)."
E, de fato, em 3 de dezembro, quando foi publicado o 29º boletim do Grande Exército, a opinião pública ficou consternada: "Mais de 30 mil cavalos pereceram em poucos dias (...). Sem cavalaria, não podíamos avançar mais do que um quarto de légua; entretanto, sem artilharia, não podíamos arriscar uma batalha e ficar plantados, esperando; precisávamos marchar para não ser forçados a travar um combate que a falta de munição nos impedia de desejar (...)".
Não obstante, o imperador, com um séquito que não seria capaz de proteger nem mesmo um jovem abastado que fizesse uma viagem de recreio, atravessou territórios em que o nome francês era execrado. Fácil seria um assassinato, uma emboscada, ele sabia, mas não se deixou intimidar e comentou livremente sua derrota. "Foi a Inglaterra que me empurrou, que me obrigou a fazer tudo quanto fiz", disse ele. "Se ela não tivesse rompido o Tratado de Amiens, se não tivesse feito a paz depois de Austerlitz, depois de Tilsit, eu teria ficado em casa tranqüilamente (...). Só me teria ocupado da prosperidade interna (...). Não sou mais inimigo do que qualquer outra pessoa dos prazeres da vida. Não sou um Dom Quixote com necessidade de sair em busca de aventuras."
Seu regresso a Paris foi aclamado com emoção pelos adeptos, que tinham os corações novamente abertos para a esperança. A confiança e a segurança renasceram: afinal, ele, o imperador, estava de volta. Napoleão, por sua vez, abalado pela notícia dos últimos desastres do exército avaliava a situação: "O frio fez com que todo mundo perdesse a cabeça (...). Aquilo que cem homens corajosos teriam salvo perdeu-se diante do nariz de vários milhares de bravos (...)". Pouco a pouco, o que restava desses bravos foi retornando à França; ele os passou em revista perto do Trianon. Um regimento de 1.500 homens ficou reduzido ao coronel e a alguns oficiais e suboficiais; o imperador se dirigiu a um deles, perguntando-lhe a idade: 21 anos.
"Todo o regimento era dessa idade", esclareceu o coronel. E em seguida lamentou: "Foram sobretudo os jovens que sofreram".
A tristeza se estampou no rosto de Napoleão: "Os homens comuns sucumbiram", comentou, "os homens de ferro foram feitos prisioneiros; eu trouxe comigo homens de bronze". Não havia cálculos de quantos realmente tinham regressado com ele. No seu próprio balanço, foi realista: "A guerra da Rússia foi um péssimo negócio. Eu me enganei, não quanto ao objetivo e à oportunidade política dessa guerra, mas quanto à maneira de fazê-la (...). Estive em Moscou. Acreditei que assinaria a paz. Passei muito tempo lá. Esperava obter em uma campanha o que se devia executar em duas.
Cometi um grande erro, mas terei meios de repará-lo". O imperador mostrava confiança, mas o dobre de finados do império já estava começando a tocar.
O horror, na retirada em Berezina
Entre as passagens mais dramáticas da retirada, na campanha da Rússia, está a travessia do Berezina, em 25 de novembro de 1812. Formados do lado direito do caminho para Borissov, cidade às margens desse rio, os 20 mil homens do corpo de reserva aguardavam o Grande Exército. Napoleão deixara Moscovo em 19 de outubro.
Os soldados - artilharia e cavalaria intactas - esperavam. De súbito, apareceu uma fileira de espectros recobertos de barro, trajando vestes inomináveis. Andavam em silêncio. Seguiam-se viaturas desengonçadas, cheias de feridos. Era o que restara do Grande Exército. Na margem direita do rio Berezina e na esquerda - o lado em que se encontrava Napoleão - 120 mil russos iriam juntar suas forças, fechando o bote.
Napoleão contaria com não mais de 30 mil combatentes realmente aptos. Parecia impossível que o Grande Exército conseguiria escapar. Na noite de 25 de novembro, o imperador examinara a ponte de Borissov, que apresentava rupturas em três pontos. Em frente, na margem direita, as baterias do almirante Tchitchakov mantinham sob fogo pesado o local. Ninguém pensava em fazer a travessia ali, mas havia que iludir os russos quanto a uma tentativa de reconstrução da obra, enquanto se fazia uma outra passagem. Um oficial descobriu que havia uma opção, a cinco léguas de Borissov, na aldeia de Studianka, onde poderia ser erguida uma ponte sobre cavaletes. Assim foi feito. Os russos caíram no ardil. Napoleão garantiu a margem direita, com 400 homens. Na manhã do dia 26, a ponte ficou pronta e os soldados começaram a atravessar. A maioria, porém, recusou-se a fazê-lo, animada por encontrar na aldeia pão e madeira para fogo. Quando o dia amanheceu - 27 de novembro - os retardatários apressaram-se. Todos queriam passar ao mesmo tempo.
Muitos foram pisoteados, outros caíram para a morte nas águas gélidas do Berezina, sob um frio de 20 graus negativos. Em outros pontos, unidades tratavam de conter as dos russos, sem nenhuma ajuda. No dia 28 outras levas passaram. Em 29 de novembro, os que restaram fizeram o caminho em pânico, sob a temperatura que caíra a 30 graus negativos. Alguns dias mais tarde, em 5 de dezembro, em Smorgoni, o imperador deixaria a horda para retornar a Paris.
A morte anunciada!
Medíocre na gramática e perdido nas funções, sem uma ideia consistente ou um dossiê estudado, Passos Coelho suicidou-se em direto no canal público e perdeu por inépcia a legitimidade que as urnas lhe deram. Sem um módico de discernimento. Sem noção das responsabilidades. Sem um projeto mobilizador ou uma desculpa aceitável.
Tropeçou nas respostas e nem as perguntas percebeu. Teve oportunidade para recuar no esbulho de 7% aos trabalhadores que nem os patrões lhe agradecem. Deu cobertura aos que apostaram fazer de Portugal um laboratório de experiências perigosas e, obstinado, persiste no erro como um drogado no pó que inala.
A vocação helénica, não na cultura milenar mas no descalabro recente, foi a constante de uma penosa entrevista em que não se deu conta da tortura a que foi submetido e do terror que infundiu nos que dependem das suas decisões.
Já não há remodelação que lhe valha sem começar por si. Já não há futuro para Portugal que passe por este primeiro-ministro. A agenda ultraliberal resultou no Chile graças à polícia política, não resulta na Europa onde ainda se respeita a democracia.
Passos Coelho não é apenas o político incompetente, é um indivíduo medíocre que não percebe que conduz Portugal a caminho de Atenas. É a tragédia que se adivinha.
In "Ponte Europa"
14 DE SETEMBRO: AS HISTÓRIAS DESTE DIA
quinta-feira, 13 de setembro de 2012
Bandeira de Portugal reflecte a política de austeridade
AUSTERIDADE PARA OS TRABALHADORES É O MESMO QUE BANCARROTA
A caminho do meio milhão
A caminho do meio milhão
|
A todos os visitantes OBRIGADO, vamos continuar
13 DE SETEMBRO: AS HISTÓRIAS DESTE DIA
quarta-feira, 12 de setembro de 2012
Para descontrair...
Dia do Banho do Padre
Na manhã seguinte, a madre superiora perguntou à irmã Madalena se o banho havia decorrido bem.
- Ah! Madre - disse irmã Madalena - eu fui salva!
- Salva? Como assim? - Perguntou a madre superiora.
- Bom, quando o padre João estava todo ensaboado, ele pediu-me para enxaguá-lo. Enquanto eu estava tirando o sabão, ele guiou a minha mão para o meio das suas pernas, onde ele disse que Deus guarda a chave do paraíso. Então, ele disse que se aquela chave coubesse na minha fechadura, os portões do paraíso se abririam para mim e eu teria a salvação e a paz eterna. Nisso, o padre João colocou a chave do paraíso na minha fechadura. Primeiro foi uma dor horrível, mas o padre disse que o caminho da salvação é mesmo doloroso, e que a glória do senhor iria encher o meu coração de êxtase. Assim foi, eu fui salva!
- Aldrabão!!! - Berrou, furiosa, a madre superiora - Há mais de trinta anos que ele me diz que aquilo é um apito para chamar os anjos...
Era sábado, dia do banho do padre João. A jovem irma Madalena já havia preparado a água e as toalhas, exactamente como o velho padre gostava. Irmã Madalena foi também instruída para não olhar para o corpo nu do padre, e fazer apenas o que ele lhe pedisse. E rezasse...
Na manhã seguinte, a madre superiora perguntou à irmã Madalena se o banho havia decorrido bem.
- Ah! Madre - disse irmã Madalena - eu fui salva!
- Salva? Como assim? - Perguntou a madre superiora.
- Bom, quando o padre João estava todo ensaboado, ele pediu-me para enxaguá-lo. Enquanto eu estava tirando o sabão, ele guiou a minha mão para o meio das suas pernas, onde ele disse que Deus guarda a chave do paraíso. Então, ele disse que se aquela chave coubesse na minha fechadura, os portões do paraíso se abririam para mim e eu teria a salvação e a paz eterna. Nisso, o padre João colocou a chave do paraíso na minha fechadura. Primeiro foi uma dor horrível, mas o padre disse que o caminho da salvação é mesmo doloroso, e que a glória do senhor iria encher o meu coração de êxtase. Assim foi, eu fui salva!
- Aldrabão!!! - Berrou, furiosa, a madre superiora - Há mais de trinta anos que ele me diz que aquilo é um apito para chamar os anjos...
Subscrever:
Mensagens (Atom)