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segunda-feira, 31 de maio de 2010

A 1 de Junho de 1948, morreu José Viana da Motta

José Viana da Motta, nasceu em S. Tomé a 22 de Abril de 1868 e faleceu em Lisboa em 1948, pouco depois de completar os 80 anos.
Foi, sem dúvida, a personalidade mais multifacetada da vida artística portuguesa nos primeiros 50 anos deste século. Virtuose, pedagogo, compositor, ensaísta e filósofo, de raros artistas se poderá dizer, como do insigne Mestre, que foi exemplo a seguir como modelo de trabalho e tenacidade, servindo-se da sua extraordinária vocação para encontrar, através do domínio absoluto da técnica pianística, o equilíbrio da forma e do conteúdo num padrão de superioridade mental e de inexcedível dignidade artística e intelectual.

Precocemente dotado para a música e, particularmente para o piano, cedo suscita aplausos e admiração. D. Fernando (o Rei-Artista, viúvo de D. Maria II) e a Condessa de Edla, que ele escolhera para a esposa, ouvem-no e decidem patrocinar os seus estudos. Terminado o curso do Conservatório de Lisboa parte para Berlim (1882) onde, custeado pelos reis mecenas, continua durante três anos os estudos de piano e composição.
A sua primeira apresentação em Berlim (1885) constitui um inegável êxito. Que mais poderia desejar um adolescente de 17 anos, que iniciava a sua carreira de um modo tão promissor numa Alemanha agitada musicalmente por duas correntes avassaladoras - Brahms e Wagner ? No ano anterior, em Bayreuth, descobrira o encanto da música de Wagner ao assistir a uma representação do "Parsifal". Tinha passado um ano sobre a morte do genial criador da "obra de arte total" e mantinham-se acesas as polémicas que ele provocara. Viana da Mota tomou posição : foi wagneriano fiel, numa paixão que manteve até ao fim da vida. 
Em 1885 o seu desejo de trabalhar com o maior mestre do piano leva-o a Weimar onde é acolhido com agrado por Lizt.
Reconhecendo o talento daquele jovem que aceitara como discípulo, o venerando Mestre oferece-lhe uma fotografia com esta profética dedicatória : " A José Vianna da Motta, saudando os seus futuros sucessos.  Fr. Liszt ".
As lições são interrompidas no ano seguinte devido à morte inesperada do imortal pianista e compositor. Desgostoso, regressa a Berlim e, pouco depois, fixa-se em Frankfurt, onde procura aprofundar a sua formação com Hans von Bullow, que o considera um dos mais brilhantes discípulos de Franz Liszt. Admirador incondicional de Ricardo Wagner, von Bullow defende novos conceitos de execução pianística e de interpretação orquestral. Os seus ensinamentos foram preciosos para Viana da Mota que, rapidamente, se distinguiu como um dos mais reputados pianistas da sua geração. Preparado para enfrentar os auditórios mais exigentes desenvolve uma intensa e triunfante carreira de concertista, intercalada apenas por alguns períodos de férias em Portugal.
A propósito, tem interesse transcrever aqui um pequeno extracto de uma entrevista que, muito mais tarde, Viana da Mota concedeu ao "Século" e onde relata a sua primeira apresentação em Lisboa depois dos êxitos alcançados no estrangeiro: " Apresentei-me no Teatro da Trindade. A Condessa de Edla lá estava, num camarote, ansiosa por ouvir-me tocar. Num dos intervalos fui cumprimentá-la. O público, então, ao ver-me junto dela (e porque toda a gente sabia que fora ela quem pagara todas as despesas da minha educação) levantou-se e, com entusiasmo, fez-lhe uma extraordinária manifestação de simpatia. A Condessa, surpreendida com os aplausos, pegou-me na mão e fez-me avançar, como que entregando ao povo o artista que ela formara. E tão comovida estava que as lágrimas lhe caíam em torrentes pelas faces". 
Viana da Mota, cada vez mais solicitado, não cessa de se apresentar em várias cidades alemãs. Crítica e público rendem-se ao talento superior do virtuose português. Faz uma digressão pela Rússia, em 1888, e coroam-no de louros no final de um concerto em S. Petersburgo. A sua fama cresce e confirma-se, em Paris, ao tocar com a Orquestra Lamoureux.
Em 1892 visita os Estados Unidos. O público americano não esquece o sucesso e obriga-o a voltar em 1898, já depois de novas apresentações em Paris.                        
Inglaterra, Espanha, Itália, Dinamarca, incluem-se no seu itinerário de concertista. Lisboa e Porto também o aplaudem e, nesta última cidade, torna-se amigo do violinista Bernardo Moreira de Sá e ambos percorrem o Brasil e a Argentina numa série de recitais que são outros tantos triunfos.
Quando deflagra a 1ª Grande Guerra Mundial, Viana da Mota tem 46 anos. Forçado pela força das circunstâncias a deixar a Alemanha, acolhe-se na Suíça e, durante dois anos, dirige o Conservatório de Genebra.
1917 é o ano do seu regresso definitivo a Portugal, onde inicia uma nova e não menos profícua fase da sua actividade artística, agora consagrada à vida musical portuguesa. Funda então aSociedade de Concertos, que foi a primeira do seu género no nosso país e mercê da qual, durante 58 anos, os seus associados puderam usufruir a arte dos mais celebrados intérpretes. É justo assinalar que a sobrevivência da "Sociedade", nas duas últimas décadas da sua existência, só foi possível graças ao generoso e esclarecido apoio da Senhora Marquesa do Cadaval.
De 1918 a 1920 dedica-se à direcção de orquestra, regendo 4o concertos sinfónicos no Teatro Politeama, como continuador das gloriosas Tardes de Domingo, iniciadas anos antes, com o maior sucesso, pelo malogrado maestro David de Sousa (1880-1918).
Director do Conservatório Nacional de Lisboa, de 1918 a 1938, o prestígio do seu nome, a profundidade da sua cultura e o brilhantismo da sua inteligência deram àquela instituição uma fecunda vitalidade, para o que muito contribuiu a reforma de 1919, de que , com Luís de Freitas Branco, foi um dos esclarecidos mentores.
Devemos ainda a Viana da Mota a primeira apresentação, entre nós, da audição integral das trinta e duas Sonatas para piano e dos Trios com violino e violoncelo de Beethoven, quando, em 1927, se comemorou o lº Centenário da morte do grande compositor. A receita dos concertos foi destinada à fundação de um prémio "Prémio Beethoven" que era atribuído anualmente ao aluno que mais se distinguisse nas classes de Piano.
Viana da Mota, intérprete excepcional, foi igualmente um grande pedagogo. Como professor, são prova do que soube transmitir aos seus discípulos os nomes de Maria Antoinette de Freitas Branco, Nella Maissa, Luís Costa, Campos Coelho, Helena Sá e Costa, Fernando Lopes Graça, Sequeira e Costa.
Viana da Mota foi também compositor e, se é certo que as suas faculdades de criador não eram tão poderosas como as de intérprete, ocupa, no entanto, um lugar importante na renovação da música portuguesa. Entre as suas obras contam-se uma Sinfonia "À Pátria", "Evocação dos Lusíadas", "Cenas da Montanha" e, ainda, numerosas peças tanto para Piano como para Canto.
Na grande sinfonia "À Pátria" utilizou pela primeira vez no nosso país a forma ditemática ; a orquestração desta obra, terminada em 1896, representa também um enorme avanço sobre o que até então se havia feito entre nós.

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