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domingo, 14 de março de 2021

Alfredo Pereira Gomes, nasceu em Espinho, a 18 de Janeiro de 1919.

 



ALFREDO PEREIRA GOMES (1919 – 2006)

Matemático antifascista de grande prestígio. Professor universitário, foi um dos oposicionistas ao regime ditatorial do Estado Novo expulsos do Ensino por Salazar. Personalidade forte e determinada, com predisposição para aceitar desafios, em 1947 partiu a caminho do exílio e, no Brasil, destacou-se no mundo académico. Só regressou a Portugal já na década de 70. Fez parte de uma geração de grandes vultos da intelectualidade portuguesa, que se opuseram corajosamente ao regime. Integrou um grupo de matemáticos famosos, que adquiriram prestígio internacional, mas só puderam regressar à Pátria após a morte do ditador.
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1. Nasceu em Espinho, a 18 de Janeiro de 1919 e faleceu no dia 29 de Novembro de 2006, no hospital Curry Cabral em Lisboa. Era irmão dos escritores Soeiro Pereira Gomes e Alice Gomes. Fez os estudos secundários em Espinho. Concluiu a licenciatura na Universidade do Porto, e doutorou-se também nessa Universidade, em Julho de 1946. Ao contrário da maior parte dos matemáticos portugueses de seu tempo, fez o doutoramento no país, na Universidade do Porto (1). Iniciou a carreira de professor como “professor assistente”, mas em Outubro viu a sua carreira académica cortada, afastado da Universidade, por decisão assinada pelo presidente do Conselho de Ministros, Oliveira Salazar [evocando o disposto no decreto-lei nº 25317]. De facto, em 1947, ocorre a expulsão de diversos intelectuais das universidades portuguesas – entre os quais, quase toda uma geração de matemáticos – um afastamento compulsivo orquestrado pelo regime salazarista (2).
Impedido de trabalhar, Alfredo Pereira Gomes viu-se obrigado a partir para França, onde permaneceu até 1953.
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2. A convite do primeiro Reitor da então Universidade do Recife, Chega ao Brasil, onde começa por dar aulas de Cálculo Diferencial e Integral na Faculdade de Engenharia [famosa pelos vários expoentes das Ciências Exactas daquele tempo] e no Departamento de Matemática da Faculdade de Filosofia. Em breve iria ser o primeiro matemático a pertencer aos quadros da Universidade do Recife. Logo que o Instituto de Física Matemática (IFM) é fundado, Alfredo Gomes integra, com Zaluar Nunes, a secção de Matemática, e ambos desenvolvem um notável trabalho de permuta internacional de saberes e de produção documental. O IFM vai receber matemáticos de renome [entre eles, Laurent Schwartz e Alexander Grothendieck], e acolher outros matemáticos antifascistas portugueses, também impedidos de prosseguir as suas carreiras no país. Alfredo Pereira Gomes é responsável pela ida para o Recife do grupo que iria marcar aquela Universidade e deixar um legado de realizações até hoje recordadas. Ao longo do tempo, chegaram: M. Zaluar Nunes (1953), José Morgado (1960) e Ruy Luís Gomes (1962), [Aniceto Monteiro, outro matemático excepcional, exilara-se no Brasil em 1945, mas seguiu para a Argentina] (3). Alfredo P Gomes esteve na base do que veio a constituir-se como uma escola de matemáticos, no Estado de Pernambuco - um grupo de notáveis que ficou conhecido por «A Escola Portuguesa do Recife», que iria ser reconhecida e repercutir-se em outros Centros matemáticos do Brasil, a ponto de ser alvo de uma homenagem em 1997, durante o II encontro Luso-Brasileiro de História da Matemática, em São Paulo.
No Brasil, iriam deixar uma obra exemplar, que continua a ser referida, e Alfredo Pereira Gomes recordado pelos seus pares como um cientista pioneiro.
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No início da década de 1960, aceitou um convite do reitor da Faculdade de Ciências da Universidade de Nancy, para ali ocupar um lugar de professor durante um ano, aproveitando o seu ano sabático. Porém, a instauração da ditadura militar no Brasil determinou que permanecesse em França, como professor da Universidade de Nancy, por mais tempo do que o inicialmente previsto.
Sempre profundamente interessado pela evolução da situação política em Portugal, acompanha a acção da Oposição, a par e passo, com a solidariedade possível. Por outro lado, apesar do exílio, contribui para dinamizar a vida científica em Portugal.
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Em 1972, aproveitando a abertura proporcionada por Marcelo Caetano, regressou a Portugal e, durante 17 anos, foi Professor da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Em 1977 fez parte da Comissão Instaladora da Sociedade Portuguesa de Matemática (SPM), [reactivando a SPA fundada em 1940 e não legalizada]; presidiu à Mesa da Assembleia Geral, que iria ser responsável pela reabilitação da Portugaliæ Mathematica, a revista de Matemática, de que foi director até 1996.
Com uma vida dedicada à Matemática e membro activo da SPM, é nomeado sócio honorário da SPM, em 1989.
3. Nos últimos anos de vida, Alfredo Pereira Gomes tinha limitações de mobilidade e de saúde, que o impediam de estar presente em encontros matemáticos e sociais. No momento da sua morte, segundo foi referido na Gazeta de Matemática [Julho de 2007], por uma sua colaboradora da Faculdade, ele desaparecera “perante o silêncio e o esquecimento” de 34 anos de actividade científica e docente, 17 dos quais como Professor Catedrático da FCUL.
Por ocasião da sua morte foram publicados algumas notas biográficas, centradas na sua actividade científica, de que destacamos o comunicado de imprensa da Sociedade Portuguesa de Matemática. Muita documentação, correspondência e fotos relativas a Alfredo Pereira Gomes encontra-se no blogue Ruy Luis Gomes de autoria de Jorge Rezende. O Departamento de Matemática da Universidade Federal de Pernambuco tem em linha um facsimile do manuscrito da “Teoria das funções” de Alfredo Pereira Gomes. Uma nota no blogue Nós-sela inclui fotos de um dos últimos convívios de matemáticos em que participou.
No centenário do seu nascimento (18 janeiro 2019) realizou-se uma «Sessão de homenagem a Alfredo Pereira Gomes», na FCUL, no Museu Nacional de História Natural e da Ciência.
Notas:
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(1) Em 2005, em entrevista à Sociedade Portuguesa de Matemática, relatou com orgulho o facto de José Sebastião e Silva, um dos maiores matemáticos daquela geração, ter dito que a sua tese – «Introdução ao estudo duma noção de funcional em espaços sem pontos» – havia sido a primeira, das realizadas em Portugal, a ter repercussão internacional.
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(2) A 14 de Junho de 1947, o Conselho de Ministros, "certo da razão e seguro da sua força", demitiu e aposentou compulsivamente, "independentemente das penas aplicáveis pelos tribunais competentes, ou a impor em processo disciplinar", vários oficiais das forças armadas e numerosos professores e assistentes universitários: Mário Augusto da Silva, Augusto Celestino da Costa, Francisco Pulido Valente, Fernando Fonseca, João Cândido da Silva Oliveira, Adelino José da Costa, José Cascão Anciães, Carlos Torre da Assunção, Flávio Pinto Resende, António Ferreira de Macedo, Arnaldo Peres de Carvalho, Manuel Zaluar Nunes, João Remy Teixeira Freire, Andrée Crabée Rocha, Luís Dias Amado, Manuel Valadares, Amélio Marques da Silva, Armando Carlos Gilbert, João Lopes Raimundo, José Cardoso Morgado, Orlando Morbey Rodrigues.
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(3) António Aniceto Monteiro viu-se obrigado a deixar Portugal e seguiu para o Brasil em 1945. Dali partiu para a Argentina, onde se fixou. Em 1972 é designado Professor Emérito da Universidad Nacional del Sur, sendo durante mais de 25 anos o único Professor Emérito nomeado por aquela Universidade. Regressou a Portugal em 1977, trabalhando cerca de dois anos como investigador do Instituto Nacional de Investigação Científica, no Centro de Matemática e Aplicações Fundamentais. Em 1978 foi distinguido com o Prémio Gulbenkian de Ciência. De volta à Argentina, faleceu em 1980.
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Biografia da autoria de Helena Pato

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